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Frevereiro em Campina

Artigo 22.02.2021 18:40

Projeto Cultural FREVEREIRO em CAMPINA:

Revitalização dos carnavais antigos de Campina Grande – PB

< Janeiro de 2005 >

Autor: Roniere Leite Soares - Músico da Filarmônica Municipal Epitácio Pessoa

Eron ShowOrquestra Eron Carnaval Show – Campina Grande - PB, 1975

FREVEREIRO em CAMPINA

A chegada da família Capiba em Campina Grande-PB no ano de 1915 se trata de uma coincidência histórica que veio somar mais uma peça importante ao grande dominó que era o carnaval nordestino naquela época. Lourenço da Fonseca Barbosa – o Capiba, mais famoso da prole, ficou em Campina até 1924, participando como trompista da Banda Afonso Campos (grande rival da Banda Epitácio Pessoa), dirigida pelo seu pai Severino Anastásio, e atuando como pianista no Cine Fox, além de fundar em 1921 a Jazz Band Campinense. Indo para a capital paraibana aos 20 anos de idade (1924), Capiba certamente teve sua formação musical influenciada pelos sons que ouviu na Rainha da Borborema, município sempre receptivo a tendências externas.

A partir das décadas de 1940 e 1950, Jackson do Pandeiro foi um artista “campinense” que também inseriu dentro da sua discografia de rojões e forrós, um número considerável de frevos-canção. Isso se deve ao fato de que o Rei do Ritmo tem como emblema de seu trabalho interpretativo, uma paisagem nordestina essencialmente urbana. Essa marca citadina não é outra senão a da própria Campina, urbe esta que concentra hospitaleira, grande diversidade de forasteiros, costumes e influências. Esse exemplo de valorização do frevo também foi seguido por Elba Ramalho em suas gravações. Por morar no bairro de Bodocongó na década de 1960-1970, foi contemporânea dos tradicionais carnavais de clube realizados em Campina Grande - PB.

Formado por uma variedade de sambas, marchas-rancho, maxixes, polcas e frevos, entre outros, o repertório constituinte das bandas de música do Nordeste, especialmente Alagoas, Pernambuco, Paraíba e Rio Grande do Norte, constituiu-se como sendo uma riqueza material que guarda a memória musical de um povo que tem sua alma alegre e inventiva. Neste entremeio, o frevo-de-rua se destacou sobre os outros gêneros carnavalescos de tal forma que a ele se atribui características peculiares de dinamismo, criatividade, identidade, movimento, harmonia e diálogo entre os instrumentos de sopro.

No interior da Paraíba, especificamente em acervos de bandas de música, há importante registro de frevos paraibanos que se mantêm desconhecidos devido ao fato de que neste Estado não existe uma política cultural clara de incentivo à produção e publicação de músicas originalmente brasileiras. Em Campina Grande não é diferente. Cidade interiorana de várias bandas, inclusive com uma delas centenária, permite a qualquer pesquisador deduzir a existência de peças musicais que confirmam essa realidade.

Em fevereiros da década de 1960, ocorriam concursos de frevos inéditos, promovidos por clubes campinenses, entre os quais, Ipiranga, Campestre, Gress, Clube dos Caçadores, AABB, BNB, Campinense Clube, Clube dos Trabalhadores, Clube Paulistano, etc. Os bailes adultos ocorriam pela noite enquanto que as matinês eram realizadas pela tarde, para um público infanto-juvenil. Todas as despesas dependiam da bilheteria e das vendas de bebidas. Alguns compositores carnavalescos que estrelavam nesse meio eram, entre alguns, Hermann Capiba (irmão do velho Capiba e autor do frevo campinense Briga de Foice, de dificílima execução), Antônio Guimarães, Manoel Israel, Bolinha, Romão Inácio de Farias, Espedito Gomes, João Batista, Alfredo Macena de Andrade, Antônio Amâncio... E assim perduraram até o início da década de 1980. Dentre todos os compositores, Alcides Leão (foto) foi o mais famoso, pois seus frevos eram parte integrante de quaisquer orquestras frevistas, inclusive as pernambucanas. Alcides nasceu em Campina Grande em 19/12/1916 e morreu em Recife no mês de julho de 1973. Em Pernambuco, foi várias vezes campeão de concursos de músicas carnavalescas. De sua obra frevística, destacaram-se: Parada Dura (1959), Envenenado (1962), Tiririca (1964), Dose para Leão (1974) e Mordido (1975) – o mais conhecido entre os músicos.

Alcides Leão, compositor campinenseFoto: Compositor campinense Alcides Leão

Entre as orquestras de frevo formadas nas décadas de 1960-1970, podemos destacar a de Eron (capa), a Orquestra do Maestro Bolinha e a Orquestra Campinense de Frevo, comandada pelo Maestro Espedito Gomes por 17 anos consecutivos (1966-1983). Ainda sobrevive a Orquestra Marajoara de Frevo, do maestro Chiquinho Bozó. A Orquestra Primavera é outra mais recente que abrilhanta anualmente o bloco Zé Pereira, em tempos de Micarande. Outra que está na ativa é a Orquestra de Humberto Guaraná, animando freqüentemente o Bloco da Saudade.

Num contexto atual em que o descartável está em ênfase, a “descoberta” de uma produção musical anônima de tão grande riqueza artística, é, por parte da Prefeitura Cidade de Campina Grande, uma nova idéia, uma atitude de autovalorização que, além de se contrapor ao modismo globalizado, melhora a auto-estima de uma cidade que perdeu desde o início da década de 1980, o referencial dos grandes carnavais de clube que nela aconteciam.

Material humano não falta em nosso município. Basta apenas olhar para as orquestras de frevo assim como as prefeituras olham para as bandas de forró em períodos juninos: olhar de apoio para que nós possamos nos orgulhar do que realmente é “da gente”.

A retomada dos velhos carnavais de Campina Grande consistir-se-á em:

a) Desfile de blocos pelas ruas centrais: os blocos populares seriam formados por todos aqueles foliões que não têm alternativa para brincar o carnaval fora da cidade. Os nomes dos blocos seriam associados a pássaros da nossa região, tais como galo de campina, concris (pássaro laranja), “pinta-silva” (amarelo), azulão, etc.

b) Participação das orquestras de frevo: formadas por músicos campinenses e de cidades circunvizinhas, contratados exclusivamente para este fim. Essas orquestras farão o desfile em destino aos clubes tradicionais de Campina Grande, com percurso a ser determinado pelas Secretarias de Cultura e Turismo.

c) Gravação de uma dúzia de frevos de autores campinenses: as composições serão escolhidas de acordo com o conhecimento prévio de repertório antigo e recente. Serão distribuídas 1000 cópias de CDs entre as escolas públicas, autoridades, rádios, servidores municipais e população de um modo geral.

Orquestra de João Batista (de óculos), Campina Grande – 1964

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